28 de dezembro de 2013

Série Instalações de Arte (1) | Yayoi Kusama


“Desejei prever e avaliar a infinitude de nosso vasto universo com a acumulação de unidades de rede, uma negativa de pontos. Quão profundo é o mistério do infinito sem fim em todo o cosmos. Enquanto apreendo isso tudo, quero enxergar a minha própria vida. Minha vida, um ponto, ou seja, uma em meio a milhões de partículas. Foi em 1959 que me manifestei sobre [minha arte] obliterar a mim e aos outros com o vazio de uma rede tecida com uma acumulação astronômica de pontos.”

Yayoi Kusama

A mostra itinerante, trazida ao Brasil pelo Instituto Tomie Ohtake, entitulada “Yayoi Kusama: Obsessão Infinita”, inaugurada no dia 12 de Outubro, reúne obras da artista Japonesa Yayoi Kusama.  As obras selecionadas para a mostra variam desde pinturas a performances e acompanham o trabalho da artista desde 1950 a atualidade.

Retrato da Artista - Yayoi Kusama
Nascida na cidade de Matsumoto em 1928, no interior do Japão, a artista começou a pintar ainda jovem, influenciada pela pintura tradicional japonesa - Nihonga. Mudou-se para Nova York em 1958, onde entrou em contato com a obra de Joan Miró e Max Ernst, que vieram a se tornar grandes influências para o seu trabalho. 

Desde pequena a artista sofre de uma doença que a leva a ter alucinações, transtornos de despersonalização e depressão. Dentre algumas de suas alucinações, a artista relata ver as figuras de suas pinturas transcenderem as molduras que as encerram, cobrindo então as paredes do ambiente. Seus característicos pontinhos, recorrentes em sua produção mais recente, nada mais são do que representações dessas explosões visuais.

“a polka-dot has the form of the sun, which is a symbol of the energy of the whole world and our living life, and also the form of the moon, which is calm. Round, soft, colorful, senseless and unknowing. Polka-dots become movement... Polka dots are a way to infinity”.

[Tradução] O pontinho tem a forma do sol, que é um símbolo de energia do mundo inteiro e da nossa vida, também é a forma da lua, que é calma. Redonda, macia, sem sentido e sem consciência. Os pontinhos se tornam movimento...os pontinhos são o caminho para a eternidade.

Yayoi Kusama

Abaixo, vemos a sua obra "Sala dos Espelhos do Infinito", na qual uma série de espelhos colocados frente a frente ampliam a nossa sensação de espaço, gerando um labirinto de luz. Não conseguimos distinguir um limite físico e, com isso, os pontinhos iluminados coloridos parecem se multiplicar infinitamente.

Sala dos Espelhos do Infinito - 2011

“Obsessão Sexual” e “Obsessão Alimentar”

A ‘Obsessão’ do título da exposição se refere a um trabalho compulsivo sobre dois temas em especial. Dois assuntos que, aos olhos da artista, estão intimamente associados à patologia e distúrbios. Esses temas são comidas e sexo. A penetração, em ambos os contextos, chega a ser algo doentio, uma fobia para a artista. 

A fotografia abaixo foi tirada dentro da obra "Sala de Espelhos do infinito - Campo de Falos (ou entretenimento)". Somos encerrados em uma sala cujas paredes são cobertas de espelhos, ampliando o espaço infinitamente, e o piso é coberto por formas fálicas revestidas pelos emblemáticos pontinhos da artista. O fato de ser uma sala fechada e não uma passagem, como na obra anterior, aumenta uma sensação de claustrofobia. Aqui, sua obsessão é levada ao extremo.

Sala de Espelhos do Infinito - Campo de Falos 


O que impressiona é a escala. Na obra "Estou aqui, mas nada", entramos numa sala e nos vemos completamente rodeados por pontinhos, somos engolidos pelo universo distorcido de Yayoi. Nesse momento, percebemos como que deve ser ver o mundo através dos seus olhos.

Estou aqui, mas nada - 2000/2013
Segue abaixo algumas imagens da belíssima ocupação da rotunda do CCBB, ao torno da qual a exposição está organizada. As bolas flutuantes enaltecem a planta circular da rotunda, e apesar da grande dimensão das mesmas, essas transmitem uma sensação de leveza. Mesmo os passantes, que não estão lá para visitar a exposição, tem uma prévia do impactante trabalho da artista japonesa.









A mostra permanece em exposição até o dia 20 de Janeiro, de 2014, no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro(CCBB-RJ).

21 de dezembro de 2013

Um passeio pela Avenida Paulista | São Paulo

Reconhecida atualmente como um dos principais centros financeiros de São Paulo, a Avenida Paulista foi originalmente concebida como uma região residencial para a alta sociedade Paulistana. Inaugurada no final do século XIX, no dia 8 de dezembro de 1891, a Avenida emergiu como resultado de uma nova expansão urbana pelos terrenos de antigas fazendas.

Avenida Paulista em 1891

Avenida Paulista - Bairro Residencial em 1901

Foi a primeira via asfaltada da metrópole (1909). Separada em três faixas, a Avenida possuía originalmente uma via para bondes, sendo que o mesmo só foi instalado em 1900. Havia também uma faixa para carruagens e uma para cavaleiros.
Sua concepção urbanística foi bastante inovadora para a época. A implantação dos palacetes rompia com os tecidos urbanos tradicionais. Suas fachadas podiam ser afastadas do alinhamento do terreno, o que atribuía uma maior amplitude à Avenida.
Este uso predominantemente residencial se manteve até meados da década de 50, quando as casas começaram a dar lugar a grandes edifícios comerciais. Um marco desse momento de transformação foi o Conjunto Nacional de 1954, projeto do arquiteto David Libeskind.





O conjunto nacional foi o primeiro edifício multiuso na avenida paulista.  Composto por duas lâminas – a lâmina vertical, de uso residencial e a lâmina horizontal, no caso o embasamento que concilia funções comerciais como lojas, escritórios, cinema, academia, centro cultural e um terraço ajardinado- o conjunto ocupa a quadra em sua totalidade. No entanto, os seus múltiplos acessos permitem uma completa permeabilidade do objeto e uma continuidade do percurso urbano. O caráter público do térreo permite que a cidade adentre, penetre e atravesse a construção.  Seu interior adquire, portanto, o caráter de praça pública.
A Implantação da torre é afastada da calçada, permitindo uma visualização mais plena do objeto, além de gerar um vazio entre a lâmina e a avenida.  Enquanto isso, seu bloco de base cobre inteiramente o térreo.  A horizontalidade do embasamento contrapõe a verticalidade da lâmina.
Continuidade com a calçada - Térreo do Conjunto Nacional

Na avenida, também encontramos importantes ícones culturais, característicos da paisagem paulistana.  Esse é o caso do edifício da FIESP,concebido pelo escritório Rino Levi Arquitetos Associados.  Vencedor de um concurso realizado no final dos anos 60, construído ao longo dos anos 70 e inaugurado em 1979, o edifício permanece um marco na paisagem devido à sua forma inusitada. 







MASP - Projeto de Lina Bo Bardi
Mas o grande de respiro da avenida dá-se no segmento entre a Rua Peixoto Gomide e a Alameda Casa Branca onde avistamos o Museu de Arte de São Paulo, o MASP, projeto da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, em contraposição com o Parque Trianon, inaugurado em 1892 sob o nome Parque Villon.  O museu - uma caixa flutuante, sustentada por uma vigorosa estrutura de concreto, da qual apenas 4 pontos de apoio tocam o chão. O térreo é livre de construções e barreiras físicas, um espaço que foi cedido pelo projeto à cidade. Há ainda um segundo segmento do museu no subsolo. O vão livre criado aqui permite inúmeras utilizações, desde feiras a exposições, encontros, aulas e até mesmo manifestações. Recentes discussões sobre o fechamento deste vão tem suscitado indignação entre os seus frequentadores e apreciadores. Além de artigos, vídeos manifestos na internet e debates questionando essa atitude do museu, no sábado, dia 07 de dezembro, aconteceu lá um movimento ‘abrace o vão livre do MASP.’ 











Essa discussão suscita uma série de questões. A cidade é feita para quem? Sendo esse um local amplamente ocupado pelas pessoas, o que significa o seu fechamento para o público? Não seria esse um sinal claro de como estamos privatizando e individualizando o espaço público, criando espaços que excluem no lugar de incluir? Essa atitude não vai contra o movimento de pensar as nossas cidades de forma mais democrática? Há muito ainda a se fazer em termos de planejamento urbano e sobre pensar a cidade. A batalha pela permanência do vão livre enaltece a importância dessa discussão.

3 de dezembro de 2013

X | A décima edição da Bienal de Arquitetura de São Paulo


Terminou ontem, domingo dia 01 de dezembro, a décima edição da Bienal de Arquitetura de São Paulo. O tema da bienal deste ano foi “Cidade: Modos de Fazer, Modos de Usar”. Diferente das edições anteriores, realizadas ou no Pavilhão da Bienal ou na Oca, ambos projetos do arquiteto Oscar Niemeyer situados no Parque Ibirapuera, a edição deste ano optou por romper com este passado e se expandir pela cidade.

A mostra foi fragmentada em diversas unidades de exposição. Dentre os centros que sediaram uma parte do evento havia o Centro Cultural de São Paulo(CCSP), o Museu de Arte de São Paulo  Assis Chateaubriand(MASP), o SESC Pompéia, a Praça Victor Cívita, o Cemitério do Araçá, entre outros.

Em virtude da minha curta estadia na cidade, eu pude apenas visitar dois desses espaços expositivos – o CCSP e o MASP. Apesar de não visitar a bienal em sua totalidade, fiquei muito feliz com o resultado e muito bem impressionada com essa nova disposição da bienal.




Centro Cultural de São Paulo



Primeiramente, acredito que ao espalhar a bienal por vários centros culturais, a cidade participa mais ativamente da exposição. Aliás, quando se fala de arquitetura, invariavelmente falamos de cidade. Trazer o urbano para uma bienal de arquitetura cujo tema é “Cidade: Modos de Fazer, Modos de Usar”, além de ser um gesto audacioso, permite ao visitante uma reflexão muito mais aprofundada sobre o tema.

Cobertura ajardinada do Centro Cultural de São Paulo


Espaços de convivência no CCSP



Além disso, há tempos eu sentia que o fato de concentrar todo o acervo da exposição num mesmo espaço gigantesco, como era o caso no Pavilhão da Bienal, tornava a visita muito monótona. O conteúdo variava pouco e chegava um momento em que você não conseguia mais assimilar qualquer informação. Nesta edição, a transição de um centro cultural para o outro permitiu ao visitante um momento de respiro, um momento para vivenciar o fluxo da cidade de São Paulo e um momento para contemplar a sua paisagem. Só esse movimento já é muito mais esclarecedor do que muitos vídeos e textos com os quais nos deparamos na exposição.

Quanto a mostra em si, abordarei apenas as duas exposições que visitei.
No MASP, estava em cartaz a exposição “O Asfalto e a Areia”, no segundo subsolo. Nela, uma apresentação da produção de importantes artistas e arquitetos brasileiros entre os anos 1960 e 1970, entre eles Vilanova Artigas, Paulo Mendes da Rocha, Lina Bo Bardi, Hélio Oiticica e Cildo Meireles. Através de instalações, vídeos e textos, percebemos o diálogo e o confronto existente entre as esferas pública e privada no Brasil, algo que se reflete na dicotomia entre a rua e a praia.

Havia também umas séries de fotografia que abordavam o território em transformação. Dentre essas, a série “Paisagem e Terra”, de Pedro Motta, ou a “Onda de São Paulo” de Isidro Blasco. Algumas instalações também que convidavam o visitante a interagir, como o vídeo feito por um ciclista, que só é projetado a partir do momento que o visitante monta na bicicleta em exposição e começa a pedalar para ativar o projetor.

Já o CCSP, destacado como a base principal da Bienal, reuniu o maior conjunto de pesquisas e exposições especialmente produzidas para o evento.



"Le Grand Ensemble" Serie Explosions (2001-2008) Mathieu Pernot

 “Fazer” e “usar” a cidade pareciam ser, até pouco tempo atrás, pares dicotômicos, que aludiam, de um lado, às forças políticas e econômicas que constroem a cidade no desenho do arquiteto e, de outro, ao uso dos espaços urbanos pela população. Hoje, no entanto, está claro que esses polos não se separam, pois usar é fazer e vice-versa, e não daremos conta da complexidade crescente das cidades sem arquitetarmos seus fazeres e usos de maneira dialógica.

A exposição abrangia a problemática das urbes contemporâneas. Nela acompanhamos estudos sobre a cidade do Rio de Janeiro – o projeto “Rio Metropolitano”, com uma análise das tipologias típicas e atípicas da cidade do Rio de Janeiro, e o “Novas Cartografias” considerando o impacto das obras para as Olimpíadas, para a Copa e as demais questões que vem moldando o território metropolitano carioca.
Havia também um segmento apresentando algumas cidades dos Estados Unidos – Detroit e Los Angeles, sobretudo - onde a cultura do automóvel está tão profundamente enraizada que estas se deparam agora com uma grande quebra de paradigma. Como lidar com o colapso de uma estrutura individualista, que gira inteiramente em torno do carro, em face de um movimento de democratização da cidade?






China. Cidades fantasmas(O Caso de Ordos Kangbashi) x Cidades Superpopulosas.
Ou o caso impressionante das imitações à escala urbana, como em Shenzhen, que chegam a copiar cidades inteiras.



Série "Made in China" (2013), fotografias de Valentina Tong.


 Para enaltecer essas discussões, a mostra traz depoimentos de grandes autores do passado, como Alison e Peter Smithson, a discussão sobre projetos icônicos como o COPAN, de Niemeyer, ou sobre um projeto de Sérgio Bernardes para o Rio de Janeiro, assim como também a exemplificação através de mídias que transcendem a arquitetura, como o cinema e a música.



Em resumo, acho que a bienal desse ano se mostrou muito mais diversificada e convidativa. Não apenas aos arquitetos, mas aos demais interessados no tema também.