3 de setembro de 2014

the federation square | Melbourne


Fui a Melbourne com o intuito de percorrer o seu centro adaptado à escala das pessoas, já relatado aqui no blog no texto A escala humana de Melbourne , mas também para conhecer a sua ousada arquitetura. O ápice dessa ousadia eu verifiquei no projeto do ‘Federation Square’.  A primeira vez que avistei-o foi à noite e a distância; era um festival espetacular de luzes e fiquei curiosíssima para saber do que se tratava. Voltei no dia seguinte de manhã e encontrei uma ambiência completamente diferente.

Trata-se de um dos maiores complexos culturais da cidade. Vencedor de um concurso realizado em 1996, o projeto é resultado de uma parceria entre o escritório inglês Lab Architecture Studio e o Bates Smart, de Melbourne. O projeto integra-se ao movimento urbanístico de devolver o espaço do centro da cidade para as pessoas. Historicamente, as margens do rio Yarra foram predominantemente ocupadas pelo sistema ferroviário, o que separou a cidade da água.  O Federation Square reestabelece essa ligação, elevando o espaço público sobre a estação de trem e levando as pessoas para perto da água.  O resultado disso é um imenso complexo de blocos aurônomos organizados em torno de uma praça.





Quando lá cheguei, a praça estava amplamente ocupada.  O espaço é provido de um mobiliário urbano variado; bancos, degraus, patamares e muretas oferecem pontos de descanso e grandes pérgulas hexagonais oferecem sombra para os dias ensolarados.  Sobre as laterais dos prédios foram aplicados telões que, no momento da minha visita, transmitiam ao vivo os jogos de tênis do Australian Open, e muitas pessoas aproveitavam o horário de almoço para assistir o torneio.  No nível térreo, encontramos ainda restaurantes, museus, lojas, cafés e um centro de informações.



O complexo cultural conta com múltiplos acessos. Entre os blocos que encerram a praça, há uma série de escadarias que vencem a diferença de nível em relação à via do entorno, a Flinders Street.  Pode-se também atravessar por dentro dos edifícios.  Apesar das muitas ligações entre a praça e a Flinders Street, li grandes críticas à permeabilidade urbana do conjunto e à sua relação com o entorno.  Alguns críticos consideram que, numa tentativa de valorizar a praça, a composição criou um grande muro ao longo da via principal. De fato, como podemos ver na fotografia abaixo, a calçada da Flinders Street fica vazia visto que é muito mais agradável andar por dentro da praça.



Transversalidade dos edifícios - É possível acessar a praça interna a partir de galerias internas.
Flinders Street vazia
Sobre a composição arquitetônica, devo dizer que achei o complexo feio de modo geral. Senti que faltou uma coerência na linguagem.  Ao misturar tantas soluções com estilos tão distintos, não existe um que sobressaia e com isso, gestos importantes perdem a força.  Isso não quer dizer que não há aqui soluções interessantes. Gostei especialmente da fachada metálica perfurada do acesso ao NGV-The Ian Potter Centre. Só achei que, como o revestimento das fachadas por si só já varia em termos forma, paginação, tonalidade e aberturas, a pavimentação da praça poderia ser mais sóbria.  As pedras do piso repetem o mesmo jogo de cores da fachada; ficou muita informação.

Entrada Ian Potter Centre




Há ainda o grande átrio para a National Gallery, um espaço impressionante mas tão repleto de informações que te deixa meio tonto.  São tantos elementos que você não sabe para onde olhar primeiro. Uma caixa de vidro com limites pouco demarcados, o que atribui uma grande a continuidade do espaço interno com o exterior.  A esquadria é sustentada por uma estrutura em teia, o que repercute em um desenho de sombra e luz extremamente singular no interior.  Independente de ser feio ou bonito, não deixa de ser impressionante.





Não questiono o sucesso do projeto.  O conjunto foi bem incorporado pela cidade e tornou-se um local cheio de vida ao permitir uma ampla utilização do espaço. Esse gesto de devolver o espaço no centro às pessoas representa uma grande conquista da cidade e, nesse sentido, o Federation Square é o ápice desse movimento.  Ele reconquista o espaço público e as margens do Rio Yarra de forma retumbante e monumental.