1 de agosto de 2011

SOUTO MOURA e a arquitetura portuguesa

Tive a oportunidade de voltar a Lisboa.  Conheci a Casa de história da Paula Rego, um novo museu de Eduardo Souto Moura, em Cascais. Acho a arquitetura portuguesa tão sensível e contundente. Ela me parece de poucas palavras. Não faz uso de grandes conceitos filosóficos em seu discurso, como percebo muito aqui na França, por exemplo.  Ela não se apóia em grandes imagens para enaltecer o produto final.  Ela é simples, porém rigorosa no seu desenho.  Já tinha percebido isso na temporada em que estive estudando por lá.  Eles tem uma verdadeira preocupação com a qualidade dos espaços e uma completa compreensão de todo o funcionamento do edifício.  Nada é gratuito e cada detalhe faz sentido no conjunto, desde a estrutura ao detalhe da maçaneta.
Lembro de uma conversa que tive com um amigo belga enquanto estudava lá.  Ele criticava essa arquitetura por considerá-la congelada no tempo.  Como se ela não tivesse evoluído além do moderno.  Concordo que as premissas básicas da arquiteutra portuguesa ainda sejam muito baseadas no moderno, mas ela está longe de ser retrógrada, ou mesmo óbvia.  Ela nos surprende nos seus percursos, o rompimento com os eixos, os emolduradamentos da paisagem, a relação entre o dentro e fora - e isso é muito forte no novo projeto do Souto Moura.



Há um momento na exposição em que de repente temos um canto com o pé direito rebaixado, em que muda o eixo de do percurso, apenas para contemplar o jardim externo.  O projeto pensa em cada ângulo, cada ponto de vista do observador.  É extremamente humano e singelo.























Todas os vãos de passagens estão nos cantos da sala, integrando-se com as paredes.  Não são buracos que parecem ter sido encaixados, mas vazios que fazem parte dos planos desde o momento de sua concepção.


A forma deste edifício é extremamente dramática.  Primeiro de tudo pelo uso do tom avermelhado, tão forte e feminino.  Sinto que na fachada podemos perceber logo essa essência tão íntima da pintora.  Quase um olhar para dentro da alma feminina. 
Apesar de uma delicadeza latente, as formas são também fortes e pesadas, quase ameaçadoras. Espelha um pouco da dura história de vida de Paula Rego e dos seus traumas do passado, que se fazem tão presente em sua obra. E o Souto Moura teve essa visão.
Tamanho é o seu respeito pelo existente, que o prédio foi concebido se adaptando à locação das árvores.  Durante a construção, elas foram removidas sem a sua aprovação.  Seu desespero foi tanto, que ele exigiu que elas voltassem depois todas para o mesmo lugar.
Além disso, o centro cria duas grandes chaminés, que fazem referência ao Palácio de Sintra(foto abaixo).  Uma arquitetura contemporânea que cria uma relação com a tradição e a história.















E essa atitude projetual está clara em todas as suas obras.
Estive numa conferencia do Souto Moura aqui em Paris recentemente, onde ele defendia essas mesmas ideias.  Uma abordagem enraizada no contexto e na problemática que o programa exige.  Uma preocupação com as entradas de luz e na hierarquia dos espaços.  Basicamente, é um conhecimento sobre o espaço na sua forma mais pura.  Nosso olhar não é desviado por formas espetaculares.  Elas não estão aqui para nos distrair.  Nossa atenção é focada no espaço e, por isso mesmo, ele chega a ser extremamente impactante.

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